O poder do “Fazer Manual” na vida dos idosos

por | 14 de novembro de 2024 | Bem-estar, Trabalho Multiprofissional

Por Ana Pupo 

Sabemos que nossas mãos são uma extensão única de nós mesmos, representando ação, comunicação e expressão. Elas oferecem uma infinidade de possibilidades: podem aprender e executar movimentos complexos, como tocar instrumentos musicais ou se expressar por meio da língua de sinais. As mãos, sem dúvida, simbolizam a colaboração — uma mão que auxilia, que dá apoio, que se estende como uma mão amiga. 

O valor das coisas feitas à mão está no cuidado que envolve cada etapa do processo. É o gesto de posicionar cada elemento no seu devido lugar, com a intenção de que, juntos, formem uma composição única e harmônica. Cada movimento é carregado de significado, desde o primeiro corte até o último ponto. São horas de dedicação em que as mãos se ocupam de ajustar, bordar, cortar, modelar, sem descanso, buscando sempre o equilíbrio perfeito e a precisão que só o trabalho manual é capaz de proporcionar. O resultado final não é apenas o objeto em si, mas o reflexo de todo o empenho, carinho e paciência investidos em cada detalhe. 

Propor-se a construir algo com as próprias mãos é, antes de tudo, um convite para explorar nossas possibilidades individuais. É um gesto de autoconhecimento, de colocar um pouco de nós mesmos em cada fase do processo, imprimindo nossa essência e criatividade no que estamos criando. Ao fazer isso, também passamos a perceber as incríveis capacidades de nossas mãos — o quanto elas são capazes de transformar, moldar e dar forma ao que antes era apenas uma ideia. Olhar para o resultado final é, então, uma experiência reveladora: é compreender que, com empenho e dedicação, somos capazes de realizar mais do que imaginamos, de criar algo concreto a partir de nossos próprios esforços. 

Esse poder de criação, de dar forma ao abstrato, é especialmente significativo na vida dos idosos. À medida que envelhecemos, muitos de nós começamos a enfrentar uma diminuição na nossa mobilidade e na nossa autonomia. Contudo, o ato de fazer manualmente oferece uma oportunidade única de reverter essa sensação de impotência. Ao manusear materiais, seja costurando, pintando, modelando argila ou tricotando, os idosos retomam o controle sobre suas habilidades, reafirmando sua capacidade de criar e de se expressar. 

Além disso, o fazer manual traz benefícios que vão além da simples ocupação do tempo. Estudos comprovam que a prática de atividades manuais pode ajudar a melhorar a coordenação motora, aumentar a força e a flexibilidade das mãos e até mesmo combater o estresse e a ansiedade. Quando as mãos se ocupam de uma tarefa criativa, a mente se distrai das preocupações diárias, promovendo um estado de relaxamento e satisfação. O foco necessário para a execução de um projeto manual também pode funcionar como um exercício de atenção plena, favorecendo o bem-estar mental e emocional. 

Para os idosos, essas atividades também têm o potencial de proporcionar um forte sentimento de realização e autoestima. Ver o produto final de um trabalho feito com as próprias mãos é uma forma tangível de reconhecer o próprio valor e as próprias capacidades. Muitas vezes, ao longo da vida, somos encorajados a ser práticos, rápidos e eficientes, mas o fazer manual ensina o valor do tempo, da paciência e da apreciação dos pequenos detalhes. Esse processo é uma oportunidade para redescobrir o prazer da criação sem pressa, um convite a desacelerar e a valorizar o presente. 

Além disso, o ato de compartilhar esses feitos com outros, seja através da doação de um artesanato, do ensino de uma técnica ou da simples exibição de um projeto concluído, contribui para o fortalecimento de vínculos sociais. Muitas vezes, atividades manuais são realizadas em grupos ou em círculos sociais, criando uma rede de apoio emocional e intelectual que pode ser extremamente valiosa para os idosos. O simples fato de compartilhar um feito pode gerar um sentimento de pertencimento, de conexão com a comunidade e de continuidade de um legado. 

O poder do fazer manual na vida dos idosos vai muito além da atividade em si. Ele envolve a recuperação da autonomia, o resgate da autoestima e a promoção de um bem-estar físico e emocional. Cada ponto cruzado, cada linha desenhada, cada pedaço de argila moldado representa não só a materialização de uma ideia, mas também a reafirmação de que nunca é tarde para criar, para aprender, para se reinventar. Por meio das mãos, os idosos podem continuar a deixar sua marca no mundo, demonstrando que o poder da criação é uma força atemporal e universal. 

Mestranda em Cinema e Artes do Vídeo pela Universidade Estadual de Belas Artes, Pós-graduanda em Antropologia Cultural pela PUCPR, licenciada em Artes Visuais pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná, membro do grupo de pesquisa CineCriare. Realiza trabalhos como Diretora de Arte no âmbito do cinema, participou de premiações e exposições representando suas produções.