A morte está sempre presente em nossas vidas, atinge todas as faixas etárias.
A experiência do morrer e do perder um ente querido acontece em todos os ciclos da nossa existência, desde o nascimento, infância, adolescência, fase adulta e a velhice. Sem dúvida o morrer é um evento significativo e de muita importância na vida.
Muitos deixam de existir ainda na barriga da mãe, porém é na velhice que o morrer é visto de forma mais natural.
Todos nós temos certeza de que vamos morrer, mas raramente fazemos planos para este momento.
Na minha vida, a morte ficou bem próxima, quando meu pai venceu duas cirurgias cardíacas, daquelas que deixam um corte considerável no peito.
No entanto, poucos anos depois da última cirurgia dele, os sintomas reapareceram, e ele começou sentir a respiração pesada e mais curta.
Em função das duas cirurgias realizadas e da idade dele, na época tinha cerca de 65 anos, o prognóstico é que não havia mais nada a fazer, era para a família ficar prevenida.
Meu pai, completa em agosto deste ano de 2021, oitenta e três anos e, portanto, há quase 20 anos, está desenganado pelos médicos. Dia a dia vemos o quadro dele se mostrando mais severo, mas ele afirma rindo, que não tem pressa de morrer. Ele é a alegria da nossa casa, é o mais animado e feliz, mas claro que não é santo.
O que tenho aprendido ao longo desses anos é desfrutar dele, a cada momento, e orar/rezar para que ele tenha uma vida longa e uma morte rápida.
O fato de olhar a morte mais de perto, fez com que o significado da vida e do presente fosse muito maior. Parece curioso, mas a morte acrescenta mais sentido para a vida!
Comecei a procurar literatura e vídeos a respeito da morte e me deparei com a médica Ana Cláudia Quintana Arantes. A história de vida, a vivência profissional e a inquietação desta médica conferiram a ela muita sabedoria e propriedade para falar do processo de morrer. Ana Cláudia compartilha e vive a sabedoria dos pacientes terminais.
Ana Cláudia Quintana Arantes é médica geriatra, especialista em cuidados paliativos e suporte ao luto e autora de dois livros ‘A Morte é um dia que Vale a Pena Viver’ e ‘Histórias Lindas de Morrer’.
Só de pensar em acompanhar uma pessoa doente já é complicado. Muito mais complexo é caminhar ao lado de uma pessoa cujo diagnóstico médico é de impossibilidade de controlar e curar a enfermidade, restando somente aguardar o desfecho da situação com a morte. Diante de uma situação destas surge um desequilíbrio em todos os aspectos da vida. Os questionamentos são de ordem espiritual, emocional, social, familiar e a dor vai além da doença.
Neste momento, o tratamento abre um leque de ações, com o foco de facilitar uma vida real e intensa ao paciente. O ser humano que aguarda a morte e, as pessoas que estão em seu entorno, se preparam para fazer suas escolhas.
Ana Cláudia afirma com muita propriedade que “a doença pode seguir seu curso, e a pessoa tem permissão para a morte natural. Entre adoecer e morrer há muito o que fazer pelo bem de quem vive este processo tão delicado e sagrado em sua vida. ”
O acolhimento amoroso e verdadeiro sobre a evolução do quadro clínico com o paciente e seus familiares é uma forma respeitosa para a manutenção da dignidade da vida até o momento final. Cuidar e amar a pessoa amplia sua vida e pode trazer perspectivas inusitadas. Um exemplo disto ocorreu com a mãe de uma menina, que escreveu cartas para ela, a cada aniversário até a chegada da sua maioridade. Também são comuns os pedidos de perdão e reconciliações. Enfim, as atitudes que, por vezes, não temos ao longo de décadas emergem em poucos dias.
Neste momento, a pessoa que aguarda a sua morte, tem condições de se posicionar com relação ao que acha pertinente ao tratamento, e isto também confere alívio aos familiares. Nesse quadro as pessoas são verdadeiras, agregadoras e respeitam o ser humano que enfrenta a morte.
Ana Cláudia faz considerações marcantes e que impactam diretamente no paciente e nas pessoas que estão ao seu lado.
A consciência torna a pessoa um ser humano melhor e desta forma é possível realizar as escolhas mais significativas e verdadeiras do como viver até que a morte chegue. Isto é muito diferente de ir morrendo enquanto há vida.
Morrer é parte da vida, é humano morrer. Essa verdade traz o real entendimento do que é importante na vida.
Para mim, foi e é um presente acompanhar vídeos, livros e matérias da Dra. Ana Cláudia Quintana Arantes. Isto somado aos anos de convivência com o meu pai com a recomendação médica de “prepararem-se”, intensificou o nosso laço de amor. Foi para mim que ele explicitou: “Por favor, não me deixe morrer em um hospital, quero ficar quietinho em casa!”
Na minha casa fazemos o melhor para ele, por vezes até exageramos e o deixamos um pouco mimado, mas nosso amor é incondicional e conscientemente queremos viver intensamente tudo o que é possível com o nosso papai!
Caro leitor, te convido a um mergulho pessoal e, também um olhar profundo junto aos seus entes queridos. É possível e altamente recomendável cuidar do seu morrer e acompanhar vivendo intensamente o morrer dos seus queridos!