“O problema não é minha idade, é o seu preconceito!”

por | 18 de julho de 2024 | Planos de Vida, Vida e Carreira

Por Yumara Lúcia Vasconcelos 

A imagem da pessoa idosa (ou daquela considerada idosa) é recorrentemente relacionada à redução da capacidade laborativa e da participação (engajamento) social, em alguns casos até à incapacidade para o trabalho. Isso acontece porque ainda se observa a prevalência das representações negativas acerca do envelhecimento. Essas visões negativas são alimentadas pelo mercado antienvelhecimento e seus padrões estéticos exigentes. 

Não é sem razão que permitir-se envelhecer naturalmente, sem conflitos internos, tornou-se desafiante e inovador em uma sociedade cada vez mais artificializada. 

Os estereótipos negativos estão organizados em torno de quatro eixos: cognição, estética, capacidade para o trabalho e saúde. 

No mundo do trabalho, a pessoa idosa é analisada a partir de uma expectativa social de declínio de capacidade, fortemente disseminada e acatada. O etarismo ganha, então, contornos estruturais. A idade considerada produtiva é cada vez mais encurtada, em razão do aumento da expectativa de vida da população. 

Segundo as autoras Denise Maria Lopes Zanutto e Daniela Menengoti Gonçalves Ribeiro, cuja obra recomendo, ”Há uma diversidade de características fisiológicas, psicológicas e sociais atribuídas ao envelhecimento que podem influenciar a imagem do idoso, mas a decadência biológica, causadas pelas limitações do ponto de vista comportamental, é a mais corriqueiramente usada.”(Zanutto e Ribeiro, 2022, p.13) 

O etarismo é, muitas vezes, tão sutil que se incorpora aos nossos processos de decisão sem que percebamos. Dia desses uma mulher de 52 anos compartilhou que tinha participado de um processo seletivo, tendo superado todas as etapas eliminatórias. Contou que na fase classificatória sentiu muita segurança em seu desempenho. Tinha certeza que aquela vaga seria sua. Disse que era, sem dúvidas, a mais experiente, reunindo todas as competências exigidas no anúncio. Passado uns dois meses, encontrou casualmente com a recrutadora em um supermercado que, pedindo discrição, confidenciou (justificando -se) que ela não teria sido admitida em razão de sua idade, considerada “avançada” pela Administração. Sim! Um caso de discriminação baseada na idade! Em choque, pela primeira vez aquela mulher se percebeu envelhecendo. Será que começamos a envelhecer pelo olhar do outro?  

Parece que somente percebemos a etiqueta social posta em nossos corpos quando experenciamos a exclusão. Esse rótulo nos afere a capacidade e valor, para depois nos classificar como produto (que não somos). 

Nem sempre esses critérios decisórios são ditos ou transparecidos, muito mais pelo medo de processos judiciais do que pelo senso e constrangimento moral. 

O problema não é a idade, mas o preconceito alimentado pelas visões negativas do processo de envelhecimento que construímos ao longo dos anos e a invisibilidade social da pauta antietarista. 

Referência: 

ZANUTTO, Denise Maria Lopes; RIBEIRO, Daniela Menengoti Gonçalves. Ageísmo e estereótipos da velhice: a proteção à imagem na Convenção interamericana sobre a proteção aos direitos humanos dos idosos e os reflexos no Direito brasileiro. São Paulo: Dialética, 2022. 

Yumara Lúcia Vasconcelos é pós doutora em Direitos humanos (UFPE- Universidade Federal de Pernambuco), doutora em Administração (UFBA- Universidade Federal da Bahia), mestre em Ciências Contábeis (Fundação Visconde de Cairu), bacharela em Direito e Ciências Contábeis. Especialidades na área jurídica: Direito civil e em Filosofia e Teoria do Direito.