Etarismo naturalizado no cotidiano das relações

por | 26 de julho de 2024 | Bem-estar, Trabalho Multiprofissional

Por Yumara Vaconcelos

O repertório etarista é vasto e abrangente, tão naturalizado que é possível reproduzi-lo sem perceber (ora por comentários, ora por julgamentos preconceituosos). Vejamos alguns exemplos de comentários etaristas: 

  • “É deselegante perguntar a idade de uma mulher.”  

Fico me perguntando o sentido dessa etiqueta de negação do processo de envelhecimento. Qual é o problema em perguntar a idade de uma pessoa? Desde quando envelhecer é constrangedor? Se o é, admita por bom senso, que não deveria ser. Quem desencadeia os constrangimentos são as atitudes de pessoas preconceituosas. 

  • “(o fato) não é de meu tempo.”  

Desde quando ganhamos a posse do tempo? Quem fez essa demarcação, do meu e do seu tempo? E do melhor tempo ou da melhor idade? Temos o controle do tempo? 

  • “Estou velha pra isso.” “Não tenho mais idade para …”. 

Afirmação como essas reforçam as visões negativas da idade e o preconceito. É um desserviço à desconstrução do pensamento  etarista. 

  • “A casa dela não tem espelho?”; “Essa coroa não se enxerga?”; “O corpo dela ficou muito feio”; “Quem era! Tão linda e agora…”; “Cadê o filho dessa mulher?”; “Gente, alguém diz pra ela que o tempo dela já passou.” 

O nosso corpo nos pertence.  

Esses comentários são marcadamente destrutivos, atacam a autoestima da mulher e a sua relação com o corpo (seu e o de outra mulher). Manipulam a sua imagem e expectativa social. Para além disso, condicionam e até determinam as suas escolhas e “lugar”.   

O que dizer das músicas e piadas etaristas reproduzidas sem qualquer reflexão? Jocosidade perversa!  Particularmente, não consigo rir de piadas etaristas porque vejo como uma prisão de corpos e mentes. Quantas de nós já não se sentiu incomodada quando os cabelos grisalhos começaram a despontar da raiz? O mundo do trabalho também exerce pressão sobre os corpos femininos e a sua apresentação, o que inclui o modo de se vestir. 

Os códigos de vestimenta (dress code) são exemplos dessa influência. Não estou indagando a sua legalidade, até porque a exigência não é vedada (decorre da prerrogativa do poder patronal), o que discuto é a pressão exercida. A referência desses códigos nem sempre reflete a nossa identidade.  

Os efeitos do etarismo superam qualquer desconforto social. As práticas etaristas são degradantes, arrogantes e invasivas. Precisamos combater o etarismo! 

Yumara Lúcia Vasconcelos é pós doutora em Direitos humanos (UFPE- Universidade Federal de Pernambuco), doutora em Administração (UFBA- Universidade Federal da Bahia), mestre em Ciências Contábeis (Fundação Visconde de Cairu), bacharela em Direito e Ciências Contábeis. Especialidades na área jurídica: Direito civil e em Filosofia e Teoria do Direito.